segunda-feira, 25 de outubro de 2010

narrado...

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

laudatório



Chegou a minha parte. Chegou a altura em que me deleito com a ausência de estranhos, em que deixa de haver entre mim e ti toda aquela multidão que se amontoa e nos remete ao anonimato, à insignificância, pelo menos a mim. Sim porque tu... tu continuas a ser o centro das atenções. Para o bem e para o mal, tu és o protagonista, da minha vida e da deles. Na época da exaltação tu recebe-los de braços abertos e eu... eu fico remetido à solidão. Sim, aquela solidão que sinto no meio da multidão apenas porque tu, que me dedicas atenção em todo o resto de tempo, deixaste de o fazer por algum... eu fico assim remetido à solidão e ao ciume, mas agora... agora não... agora somos só nós os dois outra vez, eu e tu e... às vezes deixamos aquele ser alaranjado brincar connosco, porque ele é engraçado. No resto divertimo-nos os dois a contar histórias. Eu com a minha pequenez que se entende pela imobilidade e tu... Ah tu!!! com aquelas histórias que se perdem no tempo e local... o que tu sabes... o que tu sabes do mundo, do tempo, da história... Às vezes penso nisso e fico triste. Sim, fico... só porque me inunda a cabeça com a ideia de que te sou irrelevante, de que, já na praia ao lado, estarás a dar a outro a mesma atenção que me dedicas aqui e agora! Mas esqueço... quero lá chatear-me com isso. Foste tu quem, na tua imensidão, me ensinaste a irrelevar os maus pensamentos e exaltar a alegria de te ter como Amigo e confidente... Gosto de ti... gosto de estar contigo a sós olhando quem passa... Gosto de reparar que também olhas de soslaio para o rabo das meninas que passam em marcha acelerada mesmo antes da hora do "ser alaranjado" que, de vez em quando se junta a nós... Gosto da forma como apenas me olhas e ficas a olhar enquanto esgravato com o lápis de carvão as páginas brancas do meu "notebook" de capa preta descarregando desabafos como este, agora... Gosto de ti e sei que tu, pela forma como sorris e balanças ao ver-me chegar... sei que tu também gostas de mim!!!

José Eduardo

terça-feira, 12 de outubro de 2010

bacio


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Havia a tradição de serrar a velha no tempo do Inverno. Era aí o fim do mundo, nesse tempo. Arranjávamos uma serrita e um bocadito de madeira e depois íamos, à noute, à porta das pessoas mais velhas da terra. Depois de aquelas pessoas fazerem tantos anos, nós íamos serrar a velha. Às vezes era só uma mulher ou um homem. Outras vezes, eram dois e três. Era conforme. Se fossem três, íamos a todos os três serrar a velha. Era o costume. Dizíamos assim:

- "Ó velha! Ó velha! Vou-te serrar aqui, velha! Vou-te serrar!"

E a gente com a serrita: ruca, ruca, ruca... Íamos de uma porta para a outra serrar a velha. Dizia que lhe ia chegar ao nó:

- "Ó velha! Ainda te vai chegar ao nó!"

E as gentes com as serritas, zumba, zumba, zumba na ripa.

- "Oh! Vai-te embora! Tu também hás-de ser velho! Vai-te embora!"

E a gente: sarruque, sarruque, sarruque, sarruque. Naquilo com umas serritas.

Era mais a garotada que fazia isto. Homens adultos já não iam. Claro, já parecia mal. Agora, os garotitos não saíam das portas a serrar a velha. Mas elas não queriam! Se a gente fosse para o lado de baixo de uma janela serrar a velha, elas iam lá por cima buscar o bacio debaixo da cama e pumba, para cima da gente! Eram velhacas, más. A gente vinha todo molhado a cheirar a mijo.
Tinha que vir para casa tomar banho. Mas não podíamos dizer nada, porque nós é que fazíamos o mal.


in: Aldeias de memória, "Pardieiros" - História de vida de José Garcia, 2008

ba.ci.omasculino

1.vaso de noite;
2.bispote; penico.

Rayuela, cap 7

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Por mim...