sábado, 18 de abril de 2015

profusão

era uma vez um burrinho
que num prado mui mansinho
pastava com mansidão
e ao pé dele descansava
o seu dono que mostrava
ser feliz como os que são
mas eis que estranho ruido
chega dos dois ao ouvido
e põe-se o dono a perguntar:
ouviste ou foi ilusão?
são ladrões. olha que são
que te vão levar consigo.
volta o burro o doce olhar
ainda a roer devagar
e diz pró dono que o guarda:
e se um ladrão me levar
acaso terei que usar
em cima desta, outra albarda?
então responde-lhe o dono:
uma coisa só me apraz
essa ideia tola afasta
pois uma albarda te basta
e outra albarda não traz.
eis que então disse-lhe o burro:
pois então fuja você
porque o perigo certo vê
eu por mim, fico a pastar
se esta albarda que me assenta
não diminui nem aumenta
de que me serve abalar?
ensinava este burrinho
a quem se mostra tolinho
e tratos a vida dá
que é tolice afadigar-se
e em passos longos cansar-se
pra ficar aonde está!

excerto de Paradela, Miranda do Douro, do "Povo que canta" de Michel Giacometti