quinta-feira, 7 de abril de 2016

a bestificação

(...) Nos dias santificados, dormia-se até quase às dez horas da manhã; depois a gente séria e casada vestia o seu melhor fato e ia à missa, censurando aos novos a sua indiferença em matéria religiosa. Ao regressarem da igreja, comiam tortas de massa, e deitavam-se de novo até à tarde.
A fadiga acumulada durante longos anos tirava o apetite; para poderem comer, era preciso beberem muito, excitarem o estômago preguiçoso com a ardência do álcool.
Pela tarde, passeavam indolentemente pelas ruas; os que possuíam capas de borracha punham-nas, ainda que o tempo estivesse seco; os que tinham um guarda-chuva, com ele saíam, ainda que fizesse sol. Não é dado a toda a gente possuir um impermeável ou um guarda-chuva, mas cada qual ambiciona superiorizar-se ao seu vizinho, seja de que maneira for.
Quando se formavam grupos, conversava-se acerca da fábrica, das máquinas, dizia-se mal dos contra-mestres. As palavras e os pensamentos não se referiam a mais do que a coisas relacionadas ao trabalho. A inteligência desastrada e impotente lançava apenas umas centelhas isoladas, um ténue clarão na monotonia dos dias. Ao voltarem para casa os maridos buscavam questões para discutirem com as mulheres, batendo-lhes muitas vezes, sem pouparem as suas forças. Os novos ficavam na taverna ou organizavam pequenas reuniões em casa dum ou doutro, tocavam harmónio, cantavam canções estúpidas e ignóbeis, dançavam, contavam histórias obscenas e bebiam em excesso. Extenuados pelo trabalho, estes homens embriagavam-se facilmente, e em cada peito desenvolvia-se uma excitação doentia, incompreensível que precisava de encontrar saída. Então, pelo mais fútil pretexto, atiravam-se uns aos outros como animais selvagens. Havia contendas sangrentas. (...)

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